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quarta-feira, 11 de maio de 2011

Violência em comunidades

1 - Violência: políticas locais preventivas
Enfrentar o crescimento da violência por meio da elaboração de políticas preventivas de segurança pública é o grande desafio de toda sociedade democrática.

A resposta tradicional ao aumento nos níveis de criminalidade e violência consiste em ações que visam aumentar o controle e a repressão penal. Esta abordagem enfoca o problema depois que o crime ou o ato violento foi cometido e, geralmente, está relacionada a um endurecimento nas práticas do sistema judiciário, a aumentos de recursos e capacidades policiais e a reformas legislativas para tornar as penas mais rigorosas, dentre outras medidas. Nesta perspectiva, o enfrentamento do problema fica preponderantemente sob a responsabilidade dos sistemas policial e de justiça.

A comunidade deve ser vista como importante parceira na elaboração de políticas públicas preventivas e não como mero objeto dessas ações
Entretanto, é evidente que tais medidas são insuficientes para lidar com um tema complexo como este. Fatores socioeconômicos, políticos e culturais devem ser levados em consideração na elaboração de políticas públicas de segurança, pois é preciso conhecer e entender as possíveis causas da violência e da criminalidade e os fatores de risco associados a elas para que se possam construir comunidades mais seguras.

Nesse sentido, a comunidade deve ser vista como importante parceira na elaboração de políticas públicas preventivas e não como mero objeto dessas ações. Configurações sociais distintas tendem a apresentar problemas específicos e as formas de compreender, prevenir e controlar esses problemas podem surgir a partir do próprio processo reflexivo da comunidade.

Assim , é fundamental que as ações governamentais reconheçam esse papel dos agentes sociais comunitários e envolvam os diversos setores da comunidade na elaboração e implementação de ações que busquem reduzir os índices de violência e de criminalidade.


2 - A participação comunitária
Vários programas bem-sucedidos de controle da criminalidade vão além do Sistema de Justiça Criminal e não são realizadas exclusivamente pelas organizações formais. Programas que integram ações do Estado e da sociedade podem ser muito mais eficazes.

A participação comunitária é um desses elementos essenciais ao desenvolvimento, planejamento, implementação e monitoramento de uma estratégia de prevenção do crime e da violência e não se resume a uma mera consulta a seus membros sobre as estratégias mais adequadas de atuação.

A participação comunitária pode ser utilizada com eficácia para o benefício de todos
É preciso garantir uma participação comunitária ativa, em que todas as opiniões e decisões são planejadas e compartilhadas entre todos, para favorecer o processo de apoderamento dos problemas e, conseqüentemente, da responsabilidade em desenvolver soluções para resolvê-los.
Dessa forma, é importante que todas as partes interessadas sejam convidadas a participar do processo, especialmente aquelas diretamente envolvidas. Isso poderia incluir ONGs, igrejas, escolas, empresas, sindicatos, organizações cívicas, grupos esportivos, a polícia comunitária, entidades comunitárias, associações de moradores, associações do comércio informal etc. É extremamente importante que se tenha consciência sobre como a participação comunitária pode ser utilizada com eficácia para o benefício de todos os envolvidos.

Nesse ponto, destaca-se a importância de valorização de espaços comuns aos agentes sociais comunitários. Espaços que se formem como referência de capacitação e de construção do diálogo, das práticas de reconhecimento e de ação preventiva. A escola pública, nesse sentido, ressurge como um lugar de resgate dessas práticas, como veremos a seguir.

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3 - A função social da escola
Na atualidade, a escola voltada para a educação cidadã apresenta-se como um importante espaço de encontro da comunidade, de convivência social, de compartilhamento, de busca e produção de saberes e experiências diferentes, sendo esta sua função social.

De maneira geral, a escola pública distribui-se espacialmente por bairros, priorizando o atendimento à comunidade local. Essa configuração permite que ela seja um espaço que reúna, além de jovens e crianças, pais, funcionários, professores e demais membros da comunidade.

Contudo, o quadro geral de violência nas escolas, que envolvem depredações ao espaço físico, ocorrência de delitos, a presença do tráfico de drogas, o abandono dos cuidados básicos ao ambiente escolar faz que, muitas vezes, um lugar público, portanto, de todos, transforme-se num espaço de ninguém. Por vezes a escola representa um ambiente que mais oferece risco do que proteção e convivência saudável entre as pessoas de uma mesma comunidade.

Escola apresenta-se como espaço de encontro da comunidade, de convivência social, de compartilhamento, de busca e produção de saberes e experiências diferentes
Em alguns casos, a escola também é apontada como um lugar desconexo da realidade local, não representando um espaço de identificação dos alunos, tampouco da comunidade. O formato tradicional de escola, no qual há reprodução de conhecimento sem reflexão sobre o cotidiano e as diferentes esferas da vida das pessoas nela envolvidas, faz que o local deixe de ser visto como extensão da vida, dificultando o envolvimento e, conseqüentemente, as relações de respeito e conservação local.

Do envolvimento entre escola e comunidade podem convergir ações de melhoria tanto do ambiente interno como do ambiente de vida da comunidade. No entanto, para que isso ocorra, é necessário construir esse espaço de convivência social e comunitária, criando possibilidades de diálogo e de ações que vão além do ensino formal.

É importante lembrar que a escola reflete a sociedade, bem como esta última passa também a ser reflexo da educação que recebe. O processo educacional, no entanto, não passa apenas pela escola; a família e os núcleos de convivência social mais próximos também são responsáveis pela formação de cada indivíduo, à qual será acrescida a experiência escolar.

Parte da relação de formação do sujeito, consciente de sua responsabilidade na sociedade que resulta em práticas cidadãs, surge desse aprofundamento das relações entre escola e família, além do envolvimento com outros movimentos sociais locais. A abertura da escola requer, assim, um projeto pedagógico que exerça atividades com objetivo de envolver a comunidade.

A cidadania abriga a esfera do cumprimento de direitos e deveres na relação entre a sociedade e o Estado, mas também envolve uma organização horizontal da sociedade. Dessa forma, os indivíduos tendem a reconhecer a si próprios e os outros, tomando ciência de suas responsabilidades e da relação de solidariedade e obrigações mútuas.

A comunidade, organizada e envolvida com as questões do universo escolar, participando da tomada de decisões, passa a reconhecer o espaço da escola como seu, transformando as relações de envolvimento e compromisso a partir da identificação e da noção de pertencimento.

Conhecer suas próprias necessidades e fragilidades e buscar construir resoluções aos problemas enfrentados é exercício da cidadania
Discutir questões cotidianas relacionadas à saúde, à educação, à segurança, à violência em comunidade, pautadas em suas próprias experiências, acrescentam a possibilidade de elaboração de proposições específicas de intervenção política. Conhecer suas próprias necessidades e fragilidades e buscar construir resoluções aos problemas enfrentados é exercício da cidadania, que tende a materializar as formas de diálogo entre sociedade e Estado.

Dessa forma, a diminuição da violência na escola está ligada ao seu projeto de abertura para a comunidade, consolidando um espaço público e não privado ou restrito a determinados setores da sociedade.

A escola pública reconhece suas raízes comunitárias como espaço de manifestação da liberdade, de relação entre iguais, de prática de cidadania e de enriquecimento do ser humano. Para tanto, a escola pode desempenhar as seguintes iniciativas:

  • retomar o vínculo da escola com o orçamento participativo;
  • realizar oficinas culturais e artísticas, de esporte e lazer, nos fins de semana;
  • estimular o protagonismo juvenil em atividades como o grêmio estudantil;
  • participar das reuniões de associações de moradores, clubes de mães, entre outras.
A vinculação da escola com a sociedade também é importante para construir estratégias de segurança. A partir dessa relação é possível tomar iniciativas que melhorem o espaço escolar e seu entorno no que se refere à segurança. Entre outras atividades, a escola pode auxiliar na:
  • formação e capacitação da guarda municipal como educadores sociais;
  • discussão do papel do policiamento comunitário visando à construção de uma nova relação entre a escola e a polícia;
  • divulgação e realização de debates sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA);
  • realização de ações que atendam situações de risco;
  • elaboração coletiva de uma cartilha para a guarda municipal;
  • busca de caminhos de superação da problemática da droga na escola;
  • realização de debates com os agentes e instâncias de segurança pública sobre estratégias cidadãs de segurança;
  • reavaliação do conteúdo disciplinar das escolas de formação de policiais (civil e militar), dando maior ênfase às humanidades.



4 - Ações que deram certo
A favela de Heliópolis, na zona sul de São Paulo, tem como referência uma interessante experiência de como a integração da escola com a comunidade pode diminuir a violência e transformar todo o local em um grande espaço de convivência.

Na Escola Municipal de Ensino Fundamental Presidente Campos Salles, após o início de um trabalho de mobilização com a comunidade, a violência diminuiu cerca de 50% no período de 2001 a 2005.

A idéia de chamar a atenção para a questão da violência começou em 1999, após o assassinato de uma jovem moradora da favela e estudante da EMEF. O diretor da escola, alguns professores e líderes da comunidade resolveram transformar a morte da adolescente em uma mobilização geral para obter mudanças.

A escola ajudou a promover uma "caminhada pela paz" que, na época, contou com a participação de outros três colégios da região e alguns moradores. A mobilização, que desde então acontece todo mês de junho, em 2006 contou com a participação de cerca de 30 escolas, além dos moradores que comparecem em peso.

Forte ligação com a comunidade, além de reduzir a violência, ajudou a otimizar vários projetos
A forte ligação com a comunidade, além de reduzir a violência, ajudou a otimizar vários projetos. Heliópolis é carente de espaços de lazer. Em conjunto com os moradores e com a União de Núcleos Associações e Sociedades de Heliópolis e São João Clímaco (UNAS), o diretor da escola conseguiu construir o primeiro centro poliesportivo do local.

Outra experiência interessante ocorreu em Diadema. Em 1999, o município estava em primeiro lugar no ranking de homicídios do Estado de São Paulo, com uma média de 31 assassinatos por dia. Em 2004, essa média caiu para 11 por dia, ou seja, houve uma redução de 65%. Com essa expressiva queda, a cidade baixou para o 18º lugar na lista de homicídios. Caíram também os índices de furto e assalto. Como?

Uma articulação da prefeitura com o governo estadual, uma universidade, empresas e associações comunitárias, mudaram as estatísticas, combinados com policiamento ostensivo e programas para reduzir o risco de delinqüência juvenil.

A primeira medida adotada foi a partir de uma sugestão de pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo. Por meio da análise de arquivos policiais, descobriu-se que 60% dos assassinatos ocorriam dentro de bares ou nas suas proximidades, e que a maioria das vítimas ou agressores tinha consumido álcool. A partir de tal constatação, a prefeitura determinou que os bares deveriam fechar depois das 23 horas, numa espécie de lei seca, espelhando-se em um exemplo similar realizado na Colômbia.

O protagonismo comunitário é uma das ferramentas para restabelecer efetivas políticas de segurança pública locais
Além disso, a prefeitura fez um mapa detalhado do horário e do local dos crimes para concentrar esforços nas áreas mais vulneráveis. Montaram-se operações conjuntas com policiais militares, civis e municipais com ênfase nas ruas mais violentas. A presença de guardas municipais, que ganhou reforços, andando a pé, de moto ou de bicicleta, tornou-se permanente nesses bairros. A população passou a ter acesso a linhas telefônicas para comunicar movimentos suspeitos.
Mas não apenas medidas de vigilância e repressão foram implantadas. Com base no mapeamento dos jovens que cometiam crimes, a prefeitura implementou ações de inclusão em lugares mais tumultuados. Incentivaram os jovens a voltar para a escola. A eles foi ofertada uma bolsa-auxílio, além de atividades culturais e esportivas depois das aulas e também estágios em empresas.

Nesse projeto, associações comunitárias e empresários reforçaram o uso dos equipamentos culturais e esportivos da cidade. Alguns desses espaços públicos são geridos pela própria comunidade.

Heliópolis e Diadema mostram que é possível promover bons exemplos em segurança pública. Observando as iniciativas das duas regiões, percebemos que não há um modelo exato e invariável para a prevenção da violência. Cada experiência é criada a partir da união de fatores que formam uma realidade particular e específica. De todo modo, essas experiências têm em comum a conjugação de ações preventivas e repressivas a partir do envolvimento dos agentes comunitários.

O protagonismo comunitário é, assim, uma das ferramentas para restabelecer efetivas políticas de segurança pública locais. Se de um lado esse protagonismo por si só não é suficiente para resolver o problema da violência, tampouco o Estado consegue promover mudanças efetivas, nesse e em outros setores, ignorando o influente papel da comunidade.


Fonte: Violência

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